"Economia da Guiné-Bissau também depende de nós"
12 de junho de 2019A crónica instabilidade política na Guiné-Bissau pesa e muito nos bolsos dos emigrantes guineenses que são obrigados a trabalhar mais horas extras para que suas famílias não passem fome num país paralisado devido à luta pelo poder entre os principais partidos e atores políticos. Mesmo depois das eleições legislativas de 10 de março os guineenses não vislumbram soluções para a crise que teve início em 2015.
Muitas instituições públicas do país têm vários meses de salários em atraso, outras até com mais de 88 meses, como é o caso dos Correios de Bissau. A questão é: quem paga as contas das famílias guineenses no país?
Solange Barbosa, que vive há 16 anos em Hamburgo, na Alemanha, diz que emigrantes são obrigados a ir às agências de transferência de dinheiro para pôr de pé famílias guineenses, perante um Estado incapaz de garantir os serviços básicos.
"Temos informações que há três meses que a função pública na Guiné-Bissau está sem salários, o que nos faz redobrar esforços para poder ajudar. Alguns funcionários públicos pedem-nos dinheiro para pagar as suas contas. Alguns deles, só pela forma de falar, sentimos que precisam de alguma coisa. Muitas famílias não pedem, mas sabemos que somos obrigados a enviar dinheiro tendo em conta a realidade", disse à DW África a presidente da Associação Guineense e Amigos da Guiné-Bissau em Hamburgo.
Guiné-Bissau paralisada há 4 anos
A maior central sindical guineense, a União Nacional dos Trabalhadores da Guiné (UNTG), tem feito protestos de rua para pressionar o Estado a cumprir com as suas responsabilidades, pagando salários aos seus servidores. De escolas públicas a hospitais, observam-se sucessivas greves. E o motivo é sempre o mesmo: a falta de pagamento de salários e melhoria das condições de trabalho.
Com a realização das eleições gerais em 2014 renascia a esperança para muitos emigrantes que queriam voltar à Guiné-Bissau para ajudar na (re) construção do país. Só que, segundo Solange Barbosa, com a prolongada instabilidade, muitos estão com um pé atrás.
"Agora é difícil voltar à Guiné. Muitos tentaram fazer investimentos; enviaram dinheiro, carros, mas não funcionou por causa da crise e da falta de salários. Daí que agora estão reticentes, com um pé atrás e na dúvida se voltam ou não. Dúvidas que não existiam depois das eleições gerais de 2014, mas ao que parece, as coisas estão a ficar cada vez pior".
Solange Barbosa, que preside a associação de guineenses em Hamburgo, uma organização que serve para ajudar na integração e arranjar emprego, relata que a dificuldade linguística é o maior entrave para os guineenses na Alemanha: "Há pessoas que já pagaram multas porque não leram/responderam cartas que receberam em alemão, e encontrar emprego também é difícil".
Dificuldades em mobilizar investimento
Ibraima Turé, que mudou-se para a Alemanha há 29 anos, disse à DW que com a confusão que se vive na Guiné-Bissau não dá sequer para mobilizar investimento estrangeiro. "Temos amigos que veem coisas esquisitas que acontecem lá e dizem logo: temos a intenção de ir, mas não podemos. Por exemplo, uma missão católica queria visitar o hospital de Cumura para depois pedir à Cáritas alemã para financiar o hospital, mas acabaram por não ir devido ao que leram sobre a Guiné-Bissau na internet. Uma vergonha", conta em tom de revolta.
O sonho de Ibraima Turé era de imitar o que os emigrantes ganeses fazem. "As pessoas oriundas do Gana tudo que fazem aqui é para a terra deles. Nós também queremos imitar o que fazem. Por exemplo, vês um ganês com um sapato aparentando muito uso, deformado etc., mas na sua terra essa mesma pessoa tem um prédio. Essa ambição não é possível na Guiné-Bissau com essa instabilidade política e confusão".
Além disso, de acordo com Turé, a Alemanha de hoje, para os emigrantes, não é a mesma comparativamente com a dos anos 90. "Estou aqui há 29 anos. É claro que quero voltar à Guiné. Nos anos 90 isto aqui era mesmo a Alemanha que atraía a emigração! Não é como agora, onde uma pessoa trabalha apenas para comer, não sobra nada para a poupança. E, um emigrante quando não pode tirar o proveito da emigração fica aqui para fazer o quê?".
Estima-se que mais de três mil guineenses estejam a viver em Hamburgo. A grande parte trabalha na hotelaria.