Filho do Presidente angolano lidera interinamente Fundo Soberano
8 de maio de 2013Apesar de ainda não ter sido indicado o substituto de Armando Manuel, exonerado um dia depois de ter sido nomeado para liderar o Ministério das Finanças, internamente caberá a José Filomeno dos Santos “Zenu”, filho do Presidente angolano, José Eduardo dos Santos, a liderança deste fundo financeiro. Criado com um investimento de cerca de 3,8 mil milhões de euros de ativos sob gestão, o Fundo Soberano substituiu o Fundo Petrolífero em outubro de 2012.
Na ocasião, a nomeação de José Filomeno dos Santos para o Conselho de Administração do Fundo Soberano provocou duras críticas por parte da oposição política e de membros da sociedade civil angolanos, que denunciaram então mais um caso de nepotismo e riscos de corrupção em Angola.
A remodelação anunciada na segunda-feira (06.05) ocorre cerca de sete meses após a formação do executivo angolano saído das eleições gerais realizadas em agosto de 2012, tendo atingido ainda o ministro da Construção, Fernando Fonseca, que foi substituído por Waldemar Pires Alexandre.
José Eduardo dos Santos nomeou ainda Manuel da Cruz Neto para o cargo de secretário geral do Presidente da República. Isaac Francisco Maria dos Anjos é o novo governador da província de Benguela e Rui Luís Falcão Pinto de Andrade assume o mesmo cargo na província do Namibe.
Em entrevista à DW África, o economista angolano Fernando Heitor começa por explicar como acontecem as remodelações governamentais em Angola.
DW África: Sete meses depois das últimas eleições gerais, porquê só agora esta remodelação ministerial?
Fernando Heitor (FH): A justificação é simples. É que as remodelações no nosso país infelizmente não são feitas em função do melhor ou pior desempenho dos membros do Governo. As remodelações são feitas por questões meramente subjetivas. O chefe do Executivo, que acumula um poder grande, usa de forma discricionária esta sua competência. Quando recebe informações de A ou de B, ou ele próprio chega à conclusão que determinada pessoa já não deve ficar aí, naquele lugar, ele pura e simplesmente manda-o para outro sítio ou põe-no na reserva.
Infelizmente, não se fazem remodelações aqui de acordo com os padrões a que estão habituados aí na Europa ou noutros países que se pautam por uma governação mais respeitável e mais sã. Nós já estamos habituados a isso, de tal maneira que o povo olha para essas remodelações da forma mais normal possível. E nós, que pertencemos à classe política, à classe empresarial e à classe académica vemos que isso é mais um jogo de cadeiras, “tira aqui, mete ali”. Ninguém diz por que razão fulano de tal foi exonerado.
DW África: Mas o curioso é que o Ministério das Finanças, que é o Ministério chave em Angola, praticamente de dois em dois anos tem um novo titular.
FH: Não se entende. Em qualquer outro país, à saída do ministro das Finanças há uma perturbação no mercado. Porque o ministro das Finanças, que ontem mereceu confiança, e não há nada no ar a dizer que ele fez isto ou aquilo, de repente é retirado para se colocar uma outra pessoa que estava noutro cargo. E sai esse ministro e mete-se outro. E como nós não temos aqui bolsa [de valores], na há situações na bolsa. Mas tudo anda à maneira da família, as chancelarias comportam-se da mesma forma. Enfim, este país é um país sui generis.
Porque os ministros das finanças não são mexidos assim sem mais nem porquê e principalmente sem nenhuma explicação dada ao público. Fica difícil entender como é que essas pessoas que ainda ontem mereciam a confiança do Presidente da República hoje já são mexidas assim. Sem querer personalizar, acho que o Presidente não consegue encontrar mais pessoas que de facto merecem a sua confiança e só trabalha com essas. São essas pessoas que ao longo dos anos, sistematicamente, recorrentemente, são postas aí no seio dos nossos governantes.
DW África: Mas para substituir Carlos Lopes nas Finanças foi nomeado Armando Manuel, que era o presidente do Conselho de Administração do Fundo Soberano de Angola. Acha que o afastamento desse cargo abre também caminho para a nomeação de outras pessoas para presidente deste fundo, nomeadamente José Filomeno dos Santos, o filho do Presidente José Eduardo dos Santos?
FH: Esse presidente do Fundo Soberano, que é sobrinho do Presidente, está [agora] colocado no Ministério das Finanças. O número dois do Fundo Soberano é o filho do Presidente. Certamente abriu-se caminho para que ele possa ocupar o cargo. E ele neste momento está a ocupar o cargo. Ele era o número dois, o outro foi exonerado e nomeado ministro das Finanças, portanto, em princípio ele está interinamente como presidente do Fundo Soberano, até à confirmação que virá certamente do Presidente da República ou de outra pessoa. De qualquer maneira, o que conta não são tanto as pessoas ou o grau de parentesco. É a forma, a metodologia utilizada para nomear pessoas, sem qualquer justificação pública.
DW África: É uma situação que a oposição e os membros da sociedade civil não cessam de denunciar, mas no entanto não há uma resposta a essas denúncias.
FH: Claro. O nosso papel é denunciar, é dizer que está errado e de tentar, até de forma patriótica, dizer que não é esse o melhor caminho para dignificar as nossas instituições. Quem está no poder não nos ouve e as chancelarias continuam a dar aval a este regime, como sendo um regime estável, um regime bom.
DW África: E toda essa situação tem o beneplácito da própria comunidade internacional…
FH: Pois, quando falo das chancelarias e da comunidade internacional, estou exatamente a referir-me a instituições que veem Angola como sendo um país de grandes oportunidades de investimento. Angola é um modelo em África onde vale a pena investir. No entanto, esquecem-se da componente política, da componente social, que está de facto a degradar-se e é preciso ter um bocado de cuidado.
DW África: Com esta remodelação do Governo em Angola, as críticas de má governação vão continuar?
FH: As remodelações são feitas desta forma negativa, mas não acontece nada de substancial em termos de transformações positivas para a qualidade de vida das populações. Os problemas de antes continuam latentes e sem soluções significativas.