Elite política moçambicana obtém vantagens para explorar recursos naturais
O CIP, Centro de Integridade Pública de Moçambique, publicou o cadastro mineiro do país, que segundo a organização "mostra milhões de hectares de terra tramitados a favor da elite política, sem o conhecimento das comunidades, em todos os distritos do país".
O documento expõe também os interesses do partido no poder, a Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), que é criticada pelo CIP por "ter acesso privilegiado à informação sobre a localização de recursos naturais em Moçambique".
A DW África entrevistou o analista Edson Cordeiro, do CIP, sobre o tema.
DW África: A distribuição de licenças de prospecção e pesquisa mineira é feita sem transparência em Moçambique?
Edson Cordeiro: De certa forma, pensamos que há pessoas que têm acesso privilegiado à informação e, como tal (sic), no momento, detêm as licenças para um futuro leilão ou venda das mesmas [licenças]. Porque o setor da indústria extrativa é um setor de capital intensivo e muitas das elites políticas de Moçambique não têm capital suficiente para investir neste setor. Então, detêm as licenças para um futuro, ou procura de um investidor estrangeiro, ou então para, futuramente revendê-las como forma de produzir mais-valias.
DW África: E pode dizer-se que a extensão da lista revela, de certa forma, que a venda destas licenças se tornou um padrão de acumulação de riqueza fácil por parte do partido no poder [FRELIMO]?
EC: De certa forma, revela um padrão de acumulação das elites, porque, se reparar, quase todos eles têm interesses no setor extrativo e, como também o CIP tem mostrado e vem elucidado no texto no nosso website, mostramos como o padrão de migração das áreas de interesse da elite tem mudado. E o cadastro mineiro, de certa forma, vem corroborar essa tese defendida pelo CIP: mostrar que grande parte da elite política moçambicana tem interesse no setor extrativo. O que pode trazer, de certa forma, situações de conflitos de interesse e tráfico de influências.
DW África: O cadastro cita nomes sonantes e bem conhecidos. É possível dar-nos alguns exemplos concretos?
EC: Tem lá, por exemplo, o nome (...) dos generais, como o general Alberto Chipande [primeiro ministro da Defesa de Moçambique e político da liderança da FRELIMO], entre outras figuras da elite política nacional.
DW África: Outro ponto que o CIP tem criticado são as regalias fiscais às multinacionais. Acham que estas regalias defraudam as expetativas dos moçambicanos?
EC: Sim, até há pouco tempo, não sabíamos o que estava acordado nos contratos por parte do governo com as multinacionais. Recentemente, o CIP divulgou os contratos com o regime fiscal deles. E, perante a análise que fizemos, pensamos nós que, por exemplo, os contratos no setor do carvão estão de acordo com aquilo [que há] nos contratos dos países vizinhos. Mas, depois, quando se vai analisar profundamente, vê-se nitidamente que os itens do contrato - por exemplo, quando o governo vai começar a tirar dividendos da exploração do carvão -, na nossa análise, o governo de Moçambique sai prejudicado.
Autora: Madalena Sampaio
Edição: Renate Krieger/Carla Fernandes