Angola: Insuficiências "comprometeram transparência"
1 de setembro de 2022A posição da missão de observação eleitoral do Obea é descrita na sua declaração preliminar sobre as eleições gerais de 24 de agosto, apresentada esta quinta-feira (01.09) em conferência de imprensa, na sede da Conferência Episcopal de Angola e São Tomé (CEAST), em Luanda.
Segundo o padre Celestino Epalanga, que procedeu à apresentação da declaração, os observadores voluntários do Obea cobriram, no dia das eleições, as 18 províncias angolanas em 61 municípios no período das 06:00 até ao encerramento das mesas de votação.
A missão constatou que alguns eleitores aderiram à campanha "Votou, Sentou", mas "em número muito reduzido", sendo que depois do voto os eleitores "tiveram a liberdade de regressar até às assembleias de voto para verificar ou exigir a publicação das atas síntese". "Este exercício cívico [consulta das atas síntese] foi feito de forma livre e consciente, principalmente nas áreas urbanas, sem haver registo de detenção ou prisão dos eleitores ou coação dos órgãos de ordem pública", referiu.
A missão do Obea disse ter observado alguns constrangimentos em relação às condições logísticas para todos os integrantes das assembleias de voto, nomeadamente alimentação, água, 'kits' de primeiros socorros, acesso às condições de higiene e de pernoitar nas assembleia de voto, sobretudo em áreas rurais.
Em relação à organização logística das assembleias de voto em tendas da Comissão Nacional Eleitoral (CNE), "observou-se que o espaço confinado de mais de duas mesas de voto não respeitou limites entre as urnas, cabine de votação e o espaço reservado aos delegados de lista".
O espaço limitado "pôs em causa o secretismo e a segurança do voto", apontam. "A missão observou falta de publicação da lista de eleitores em todas as assembleias de voto visitadas e falhas nos procedimentos de votação relativamente aos documentos válidos que habilita ao direito de voto", sublinhou o sacerdote, que é também o secretário-geral da Comissão de Justiça e Paz da CEAST.
A presença de delegados de lista, no total das mesas de voto, "sobretudo dos partidos MPLA e UNITA, que estiveram em 100%", foi também destacada pelos observadores do Obea.
O órgão, coordenado pelo arcebispo do Lubango e presidente da Comissão de Justiça e Paz da CEAST, Gabriel Mbilingue, disse ter registado também "insuficiência no nível de educação cívica dos cidadãos".
Em 17% das mesas de votação, adiantaram, "foram verificadas situações em que membros das mesas e delegados de lista optaram por gestos e linguagem dirigidos aos eleitores que podiam influenciar o sentido do voto". Reclamações de cidadãos eleitores na localização das assembleias de voto fizeram parte igualmente das constatações da missão de observação eleitoral do Obea.
As constatações, prosseguiu o padre Celestino Epalanga, "permitem-nos concluir que o ambiente registado no dia 24 de agosto, nas áreas urbanas e rurais observadas, foi favorável ao exercício do direito de voto aos cidadãos eleitores". "Porém, as insuficiências registadas na preparação do ato de votação, particularmente a falta de afixação das listas de eleitores com a devida antecedência, segundo estabelecido pela lei eleitoral, comprometeram a transparência do processo", concluíram os observadores.
O presidente da CNE, Manuel Pereira da Silva, divulgou na segunda-feira (30.08) a ata de apuramento final das eleições gerais de 24 de agosto, que proclamou o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) e o seu candidato, João Lourenço, como vencedores com 51,17% dos votos, seguido da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) com 43,95%.
Com estes resultados o MPLA elegeu 124 deputados e a UNITA elegeu 90 deputados, quase o dobro das eleições de 2017.
O Partido de Renovação Social (PRS) conquistou dois assentos no parlamento ao somar 1,14% de votos dos eleitores, mesmo número de deputados conquistaram a Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA) e o Partido Humanista de Angola (PHA) com 1,06% e 1,02% de votos, respetivamente.
A coligação CASA-CE, a APN e o P-Njango não obtiveram assentos na Assembleia Nacional, que na legislatura 2022-2017 vai contar com 220 deputados.
Questionado sobre a justeza, lisura e transparência do processo eleitoral, o diretor-executivo do Instituto Angolano de Sistemas Eleitorais e Democracia (IASED), membro do Obea, Luís Jimbo, disse que os observadores não têm a missão de julgar o processo.
"As eleições devem acontecer num quadro da lei, os observadores não têm esta missão de julgar um processo em si, todo ele nacional, dando um sentido de substituir a justiça de que foram livres, justas, nós estamos a constatar aquilo que foi feito de acordo a lei e aquilo que se precisa melhorar e é neste ambiente que nos pronunciamos sobre o processo", respondeu.
A missão do Obea, que integrou 61 organizações não-governamentais e as igrejas Católica, Evangélica Congregacional de Angola e Evangélica Baptista em Angola, garante "continuar a acompanhar todo o período pós-eleitoral da reclamação e do contencioso eleitoral".
Apelaram ainda a todos os agentes eleitorais, sobretudo à CNE e às forças políticas, para "tudo fazerem no sentido de manter o estrito cumprimento da lei" e ao órgão eleitoral para "disponibilizar mais informações no seu 'site'", sobretudo das atas síntese.