Crises político-militares em Bissau e em Bamako têm destaque nos jornais alemães
4 de maio de 2012A reunião do Grupo de Contacto da Comunidade dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), na quinta-feira (03.05), terminou demasiado tarde para permitir que as conclusões saíssem nas edições em papel da imprensa germânica. Mas as edições online de jornais como o Süddeutsche Zeitung não perderam tempo para informar os seus leitores no dia seguinte.
“Os chefes de Estado reunidos denunciaram os conflitos armados no Mali e na Guiné-Bissau e lamentaram as consequências negativas para a população. No seu segundo encontro extraordinário no prazo de uma semana, a comunidade de 15 Estados advertiu que esta situação não será tolerada”, escreve o Süddeutsche.
Violência em Bamako relega norte do Mali para segundo plano
O jornal austríaco Die Presse, igualmente na edição online, realça a decisão da CEDEAO de enviar tropas de paz “assim que o pedido seja formulado por Bamako”, a capital do Mali. Mas o diário ressalva que “os comissários da CEDEAO deverão ainda consultar os parceiros sobre o financiamento do envio de soldados”. E lembra que “até agora, os golpistas rejeitaram qualquer intervenção de forças estrangeiras”.
“Sangrentos combates em Bamako”, titulou o Tageszeitung. Foi com o termo do golpe de Estado militar pacífico que, nos finais de março, surgiu a esperança no seio de muitos malianos, escreveu o jornal; para logo em seguida acrescentar que "com a tentativa de um contra-golpe de Estado, o objetivo do governo de transição de organizar eleições livres e equitativas, num prazo de 40 dias, foi relegado para um futuro mais longínquo".
Relegada também, acrescentou o jornal, "foi uma solução duradoira e aceite por todos para o norte do Mali controlado desde 6 de abril pelo MNLA, o Movimento Nacional para a Libertação de AZAWAD. Mas esta solução é considerada um elemento central no conflito maliano", conclui o Tageszeitung.
Situação no Mali complica-se ainda mais
"Golpe de Estado e contra-golpe" lê-se, por outro lado, no Berliner Zeitung ao considerar que a situação no norte do Mali só tem atualmente um papel secundário para o CNRDRE, a junta militar que assumiu o poder no país a 22 de março. Isso, acrescenta o quotidiano, apesar dos militares que ocuparam o poder terem justificado a sua ação "com as hesitações do presidente Amadou Toumani Touré face às atividades dos islamistas radicais e dos secessionistas".
"O certo, destaca ainda o jornal, é que a situação no Mali, atingido por um golpe de Estado, uma secessão e uma crise alimentar, ficou ainda mais complicada desde o recente ataque das tropas leais ao presidente deposto".
Para o Frankfurter Allgemeine Zeitung, Cheik Modibo Diarra, o primeiro-ministro maliano, herdou uma tarefa difícil. Porque deve reunificar o país, quando o norte se encontra ocupado por rebeldes tuaregues e islamistas radicais, e deve garantir o regresso à ordem constitucional.
Isso torna-se mais difícil quando se sabe que o comportamento de vários protagonistas é imprevisível. Aliás, as trocas de tiros noturnas, em Bamako, na passada terça-feira, 1 de maio, foram mais uma prova evidente. O jornal conclui que "Cheick Modibo Diarra é tudo menos um homem político com experiência". E recorda que, aos 60 anos, Modibo Diarra adquiriu uma reputação mundial mas como astrofísico.
Congoleses em fuga
Um outro foco de crise ressurgiu, esta semana, e os jornais alemães escreveram sobre o assunto. No leste da República Democrática do Congo, concretamente na província do Norte-Kivu, milhares de pessoas estão novamente em fuga. Abandonam a região por causa dos combates entre o exército regular congolês e um grupo de soldados desertores comandado pelo ex-general congolês Bosco Ntaganda.
"Este ex-general e presumível criminoso de guerra", recorda o Frankfurter Allgemeine Zeitung, "é um vestígio da grande guerra do Congo, que teve início com o genocídio de 1994 no Ruanda".
O jornal explica que "na altura, Tutsi Ntaganda, que pertence à minoria tutsi congolesa dos Banyamulenge, combatia ao lado do atual presidente ruandês Paul Kagamé contra o regime hutu responsável pelo genocídio. Quando a milícia hutu Interahamwe foi expulsa por Kagamé e se exilou no Congo, Ntaganda instalou-se no Norte-Kivu. E começou a comandar as Forças Patrióticas pela Libertação do Congo, a milícia de Thomas Lubanga, tido como responsável de inúmeros massacres na região de Ituri", pode ler-se no Frankfurter Allgemeine Zeitung.
"Mais tarde, prossegue o jornal, Ntaganda surgiu ao lado de Laurent Nkunda, este também um Banyamulenge, que dizia combater as milícias hutus das FDLR (Forças Democráticas pela Libertação do Ruanda)".
O quotidiano sublinha que "nas duas milícias, na de Lubanga e na de Ngunda, Bosco Ntaganda, sempre foi o homem de Kigali. Em 2009, depois da aproximação entre os governos de Kigali e de Kinshasa, Ntaganda abandonou Laurent Nkunda com os seus combatentes, para ser integrado como general no exército congolês".
Os sucessos, algumas vezes espetaculares, conseguidos pouco depois pelo exército congolês contra as FDLR foram antes de tudo devido à presença de Ntaganda, que contou com os serviços de informação militar do Ruanda.
Ntaganda dispunha de boas e credíveis informações. Mas o jornal conclui que "no início do mês passado Ntaganda desapareceu da sua casa de Goma, situada mesmo ao lado da fronteira ruandesa. A sua extradição para o Tribunal Penal Internacional -TPI - será iminente, uma posição contestada pelo presidente Joseph Kabila [da República Democrática do Congo], pelo menos publicamente", acrescenta o Frankfurter Allgemeine Zeitung num artigo publicado na edição de dois de maio.
Autor: António Rocha
Edição: Glória Sousa