Moçambique: Crise climática e os cenários pouco promissores
2 de novembro de 2020Depois dos ciclones Idai e Kenneth, em 2019, consideradas as piores calamidades que Moçambique já viveu, o país começou a abrir mais os olhos para as consquências das mudanças climáticas.
No mundo, o país é um dos mais vulneráveis às alterações climáticas e por isso os cenários que se traçam não são nada animadores, segundo Daniel Ribeiro, ambientalista da ONG moçambicana Justiça Ambiental.
"Temos tendências para cheias em Moçambique, 9 bacias hidrográficas da África Austral passam por Moçambique. Também temos tendências para seca no sul e segundo as previsões climáticas podemos ter uma redução de 5 a 15% da precipitação em Moçambique, então, são problemas graves. E depois temos os ciclones, com o aumento da temperatura do mar estamos a ter mais ciclones e mais intensos", enumera o ambientalista.
Embora as más práticas dos humanos sejam responsáveis pela degradação climática, há questões naturais que influenciam as catástrofes que se multiplicam, particularmente no caso de Moçambique, lembra o Daniel Ribeiro.
O ambientalista "culpa" também a geografia, explicando que "40% da nossa topografia é entre o nível do mar e 200 metros, estamos conectados as 9 bacias hidrográficas da África Austral e esse área representa 50% da área do nosso país. E também temos uma costa muito longa e sensível à erosão e também o nosso oceno, o Índico, é um dos que está a sofrer um aumento de temperatura dos mais altos. Então, são todos esses factores que estão a causar impactos".
Exploração de recursos e agravamento das alterações climáticas
Enquanto os ambientalistas moçambicanos se debatem por melhores práticas de conservação, o país ruma rapidamente para uma meta questionável em termos ambientais: a intensiva exploração de hidrocarbonetos, como o gás natural no norte.
Em que medida esta corrida aos recursos naturais pode prejudicar ainda mais o país?
"Mesmo sabendo que Moçambique não é um grande poluídor, não contribui para o problema, se todas as reservas de gás e carvão forem exploradas, exportadas e queimadas, vai tornar a situação das mudanças climáticas muito pior", responde Ribeiro.
E alerta: "E se toda a gente seguir esse caminho, não há chances nenhumas de resolver esse problema climático, mas também temos de ver que uma das narrativas muito comuns de que é através da exploração dos recursos naturais que vamos conseguir desenvolver, esse não é o caso. Nenhum país em África conseguiu fazer isso".
Luz solar ao fundo do túnel...
Mas paralelamente a esse cenário pouco promissor, há sinais de esperança na luta pela preservação ambiental. O uso de energias renováveis, uma medida nesse sentido, é uma tendência que se expande cada vez mais em Moçambique. As zonas rurais, que pouco se beneficiam de energias "sujas" (das hidroelétricas), devido ao seu elevado custo, são as que mais se têm beneficiado delas, muito particularmente da energia solar.
Jan-Niclas Gesenhues é o pesquisador alemão para energias renováveis que tem trabalhado com a Associação Moçambicana de Energias Renováveis (AMER) e garante que "Moçambique tem condições ótimas para o uso de energias limpas".
Gesenhues afirma que "já hoje tem uma alta proporção de energia renovável por causa das centrais hídricas, como Cahora Bassa, a maior e mais conhecida do país. Mas o potencial de Moçambique na área de energia solar e de energia eólica está ainda longe de ser usado efetivamente. Moçambique é um dos países no mundo com as melhores condições para o uso da energia solar".
Embora a energia eólica não seja usada no país, há potencial para isso, de acordo com o pesquisador: "Como está perto do mar e tem uma longa costa, tem muito vento, por isso tem boas condições para produzir energia eólica também".
Este tema esteve em debate no sábado (31.11) na conferência "Moçambique nas tempestades da crise climática", organizada pela KKM, Comité Coordenador Moçambique-Alemanha, em parceria com a organização Inkota, ambas com sede na Alemanha.