Crescimento demográfico em África trava desenvolvimento
22 de março de 2018Os números ilustram o dilema: entre 1960 e 2015 foram canalizados para África cerca 1,6 biliões de dólares norte-americanos – mais do que para qualquer outra parte do mundo. Segundo o estudo "Fertility, growth and the future of aid in sub-Saharan Africa" - "Fertilidade, crescimento e o futuro da assistência na África a sul do Saará”, numa tradução livre, o investimento não surtiu efeito. Mais de 40% da população continua pobre. Em 2015 o rendimento médio per capita foi superior ao de 1974 em magros 200 dólares. "A distância entre a África e o resto do mundo cresce”, diz o autor do estudo, Jakkie Cilliers.
Não se trata de uma constatação nova. Países doadores como a Alemanha decidiram por isso fomentar os investimentos privados no continente. Nesse âmbito o governo federal alemão lançou, no ano passado, a iniciativa "Compact with Africa”. A teoria por detrás desta parceria é o aumento dos investimentos por parte de empresas alemãs que criará postos de trabalho e prosperidade em África.
Os Estados mais pobres não beneficiam dos investimentos privados
O estudo sul-africano confere a necessidade imperiosa de mais crescimento económico. Até 2030, 440 milhões de jovens entrarão no mercado de trabalho africano. Mas o setor privado investe o capital em países estáveis ou em crescimento. Mais de metade dos investimentos privados é atualmente canalizada para a África do Sul e a Nigéria. O conceito não se aplica aos países verdadeiramente pobres, constatam os investigadores. E concluem que estesEestados não deixarão de ser dependentes de ajuda ao desenvolvimento no século 21.
Cilliers concorda com os críticos que consideram a assistência ao desenvolvimento desprovida de sentido. A ajuda contribuiu para reduzir a mortalidade infantil, prolongar a expetativa de vida e permitir aos africanos frequentarem a escola por mais tempo, admite o estudo. Mas não é o suficiente: Estimativas atuais indicam que 38% das pessoas permanecerão pobres até 2030. E pouco adianta que os doadores aumentem o financiamento. "A assistência não consegue acompanhar o crescimento demográfico”, explica o investigador. Os cálculos apontam para 2,5 mil milhões de pessoas em África até 2050 – o dobro da população atual.
Debate controverso em torno do planeamento familiar
Por isso, diz Cilliers, não basta fomentar o crescimento económico: "A África tem que enfrentar o desafio demográfico”, afirma. Segundo pesquisas demográficas citadas pelo estudo, impõe-se uma redução da natalidade no continente para alterar a relação entre a população que trabalha e os seus agregados familiares. Atualmente a média é de 4,8 filhos por cada mulher.
O planeamento familiar provou ser um sucesso noutros países, que há 50 ou 60 anos tinham os mesmos índices de pobreza que os Estados africanos. Em muitas nações asiáticas aumenta a média da idade da população. Nesses países regista-se uma redução notável da pobreza. Na Índia, por exemplo, prevê-se um recuo da pobreza de 17% para três porcento em 2030. "Trata-se de um debate controverso que ainda tem que ter lugar em África”, avisa Cilliers. Como muitos países não têm sistemas sociais, há casais que têm uma prole numerosa para garantir a própria sobrevivência quando forem velhos.
No passado, os Estados africanos recusavam este debate por considerarem tratar-se de uma ingerência do mundo ocidental nos seus assuntos internos. Apontavam ainda para a família tradicional africana, que costuma ser numerosa. O presidente do Uganda, Yoweri Museveni, dizia mesmo que só o crescimento demográfico acelerado podia garantir o desenvolvimento económico. Só nos últimos tempos passou a ser mais reticente nas suas afirmações.Muitas comunidades religiosas recusam igualmente a noção de um controle da natalidade. "A África é um continente muito religioso. Por isso temos que falar não apenas com os líderes políticos, mas também com os líderes religiosos”, diz Frank Heinrich, vice-diretor da comissão para a África da fracção da União Cristã-Democrata (CDU) no parlamento alemão.
Investimento prioritário na saúde e educação
O estudo sugere aos países doadores e aos governos africanos que invistam nos sistema de saúde e educação. Porém, os Estados Unidos da América, que até recentemente eram os maiores investidores no setor de saúde em todo o mundo, mudaram de estratégia. O governo do Presidente Donald Trump só financia o trabalho de organizações de assistência que rejeitem categoricamente a interrupção voluntária da gravidez.
Outros doadores não consideram a questão demográfica uma prioridade, diz o presidente Fundação Alemã para a África, Ingo Badoreck. O Fundo das Nações Unidas para a População (FNUAP) "tem um défice de financiamento que roça o absurdo”, diz Badoreck. Também a Alemanha podia contribuir muito mais, conclui.