Um dos principais alvos da campanha é o ProSavana, um megaprojeto de cooperação entre Moçambique, Brasil e Japão, que analisa os potenciais do Corredor de Nacala para o agronegócio.
O ativista da Ação Académica para o Desenvolvimento das Áreas Rurais, Jeremias Vunjanhe, lembra que o ProSavana é baseado no Programa de Desenvolvimento do Cerrado, que desenvolveu o agronegócio na região. Em declarações à DW África, Vunjanhe revelou que o projeto criou conflitos de terra no Brasil, lembrando que o ProSavana envolve uma vasta área no corredor de Nacala, onde 4 milhões de pessoas devem ser afetadas.
Violação da lei e secretismo
O ativista critica "a forma como este projeto está a violar todas as leis moçambicanas, sobretudo aquelas que dizem que os projetos de categoria 'A' carecem de um estudo de impacto ambiental para a sua aprovação".
De acordo com Jeremias Vunjanhe, "o ProSavana, neste momento, está a ser aprovado sem que esse estudo tenha sido feito. E esse seria o momento de participação, de consulta e consentimento das comunidades directamente afectadas, mas também por outras entidades como organizações e universidades".
"É um secretismo que gira à volta deste projeto, que o governo moçambicano e todos os governos envolvidos nunca aceitaram discutir publicamente", conclui.
Os "mitos" do ProSavana
A pesquisadora Associada do Instituto de Estudos Sociais e Económicos de Moçambique, Natálila Fingerman, escreveu um comentário sobre os mitos que, na sua visão, envolvem o ProSavana. A análise de duas páginas foi publicada pelo próprio instituto e faz parte de um relatório preliminar de sua pesquisa de campo. O seu trabalho aborda três projetos de cooperação agrícola que o governo brasileiro desenvolve em Moçambique com o governo moçambicano e um terceiro país.
Fingerman passou cinco meses em Moçambique, acompanhando as equipas moçambicana, japonesa e brasileira no âmbito do ProSavana. A investigadora considera que o ProSavana ainda é muito recente e precisa resolver dificuldades da própria chamada cooperação trilateral, que envolve agências de três culturas diferentes.
Para Natália Fingerman, o primeiro mito envolve o chamado 'land-grabbing': a aquisição de terras por meios ilegais ou ilegítimos. "Não existe nenhuma terra que tenha sido negociada durante o processo do ProSavana", afirma, explicando que "se vier a acontecer algum negócio, acontecerá no futuro, algo assim nunca aconteceu. Algumas empresas já estão lá, sim, mas já lá estavam por outros motivos".
Segundo a pesquisadora, o ProSavana era para ser uma cópia do Programa de Desenvolvimento no Cerrado, mas está a ser alterado para se adequar à realidade Moçambicana. "Isso é algo hoje reconhecido, que o ProSavana não pode ser igual a esse programa", começa por explicar Natália Fingerman, adiantando que se trata de "uma coisa diferente".
ProSavana não é causa de conflitos, diz investigadora
"Os agricultores moçambicanos vêem a terra de uma forma diferente, há a questão da densidade populacional que existe no corredor de Nacala, que é muito diferente daquela que existia no cerrado brasileiro. Por isso, apesar de ele ter sido inspirado na proposta do Programa de Desenvolvimento no Cerrado - está a desenvolver uma ampla região, num período de longo prazo, de fortalecimento das instituições internas - reconhece-se que não poderá ser algo idêntico", afirma a investigadora.
O terceiro mito criado em torno do ProSavana, segundo Natália Fingerman, é a questão dos conflitos de terra. A pesquisadora acha precipitado dizer que os conflitos de terra que aconteceram no projeto desenvolvido no Cerrado brasileiro vão acontecer em Moçambique, uma vez que "existem conflitos de terra no corredor de Nacala, mas não estão relacionados com o ProSavana, porque este é um projeto muito novo".
"É necessário que a sociedade civil e os próprios agricultores locais tenham uma visão crítica para evitar conflitos e para saberem lidar com eles. Não se pode dizer que já existem cobnflitos ou que os conflitos brasileiros estejam a ser exportados".