Manifestantes sairam à rua em São Nicolau e São Vicente
5 de julho de 2017Milhares de pessoas participaram esta quarta-feira (05.07) numa manifestação cívica no Mindelo (ilha de S.Vicente) que durou cerca de uma hora e meia. Sob o lema "Estamos cansados de ser ignorados, basta!", a manifestação decorreu em ambiente de muita festa. Os participantes percorreram várias artérias da cidade, sem quaisquer incidentes, empunhando cartazes com palavras de ordem como "basta de centralismo”, "distribuição mais criteriosa dos recursos” e reivindicando autonomia.
A ideia da manifestação surgiu por iniciativa do movimento Sokols (uma organização de massa juvenil fundada em S. Vicente), cujo atual mentor, Salvador Mascarenhas, lançou o desafio através da sua página na rede social Facebook. Em declarações à Rádio de Cabo Verde, Mascarenhas explicou que "o que se passa no país é que os partidos políticos têm estado a não responder aos anseios da população”. Para Salvador Mascarenhas, "o Governo tem de agir consoante as vontades populares”, no entanto, o que tem acontecido tem "sido exatamente o contrário”.
Salvador Mascarenhas foi dos que mais gritou durante a manifestação. Com um megafone na mão, foi repetindo palavras de ordem: "Povo de São Vicente, povo de Cabo Verde, fizemos jus ao Dia da Independência. Hoje foi um dos maiores exercícios da liberdade de expressão em Cabo Verde. De uma forma sem precedente o povo saiu à rua para dizer o que lhe vai na alma. Queremos que nos deem autonomia e liberdade para trabalhar”, gritou.
Os manifestantes pediram ao Governo central que olhe por São Vicente. Um dos cidadãos presentes na manifestação afirmou à DW África que "São Vicente não está satisfeito e todos estão a sentir isso na pele”. Um outro mindelense mostrou-se satisfeito com a manifestação que descreveu como "extraordinária”. "Foi com civismo estonteante, não se manifestou contra nenhum Governo ou político, mas sim a favor de São Vicente, a favor da descentralização”, acrescentou.
"Inicialmente pensei que estava pouca gente, mas a manifestação superou as expectativas”, afirmou ainda outro manifestante.
Protestos em São Nicolau
Na ilha de São Nicolau, o povo também saiu à rua alertando o Governo para a deficiente ligação marítima e aérea de e para a ilha e para o desemprego jovem que se regista atualmente.
José Almeida, promotor desta manifestação, afirma que, tal como clamou o povo durante a manhã, "a ilha de São Nicolau foi abandonada”. "Prometeu-se muita solução, mas tudo ficou em promessa. Queremos que o Governo preste mais atenção à ilha. São Nicolau já foi uma ilha de referência e berço da intelectualidade cabo-verdiana”, deu conta.
"Vitalidade da democracia"
Numa primeira reação, o Presidente da República, Jorge Carlos Fonseca, disse que estas manifestações provam a vitalidade da democracia cabo-verdiana. Afirmando que "vê [a realização] de manifestações com toda a naturalidade”, o Presidente da República cabo-verdiano acrescentou que "nas democracias, o direito de manifestação, à greve, de expressão, à crítica, à diferença, à indignação e ao protesto são coisas absolutamente normais e traduzem-se de certa forma na vitalidade da democracia que nós temos”.
Também o Primeiro-ministro, Ulisses Correia e Silva, afinou pelo mesmo diapasão. "Estamos em democracia e as pessoas têm toda a liberdade para se manifestarem. O facto de estarmos a ver isso representa que há mais liberdade, não há medo e os cidadãos podem manifestar-se”. Sobre as motivações das manifestações, o Primeiro-ministro afirmou "não ter nada que opinar”.
Janira Hopffer Almada, líder do principal partido da oposição (Partido Africano de Inpedendência de Cabo Verde-PAICV), disse também que as manifestações foram um acto de cidadania. Para esta cabo-verdiana, "em democracia temos de assumir que quem dá o poder é o povo e é preciso auscultar o povo em permanência e os sinais que [este] vai emitindo”.
O presidente da União Cabo-verdiana Independente e Democrática (UCID), António Monteiro, que reside em São Vicente, concorda com os manifestantes e afirma que a ilha precisa de uma atenção especial. Para este responsável, "quando o povo demonstra, de forma ordeira e civilizada, o seu descontentamento, nós os políticos devemos ouvir, porque em democracia é o povo quem mais ordena”.