Cabo Delgado: "A inserção social pode travar o terrorismo"
25 de abril de 2022O terrorismo em Cabo Delgado teve início na madrugada de 5 de outubro de 2017, quando a população comemorava os 25 anos de assinatura do Acordo Geral de Paz em Moçambique. Quase cinco anos após o primeiro ataque no norte do país, continuam a ser discutidas possíveis soluções para travar o conflito.
Liesl Louw-Vaudran, investigadora do Instituto de Estudos de Segurança (ISS), da África do Sul, disse à DW que a intervenção militar em Cabo Delgado tem ajudado a assegurar certas áreas, mas não é suficiente para travar o terrorismo na região.
"Algumas estradas foram abertas, áreas em torno do grande projeto de gás natural líquido foram asseguradas, pelo que se espera que a atividade económica regresse. Mas chegámos a um ponto em que compreendemos que a intervenção militar não é suficiente, que precisamos de soluções políticas, soluções socioeconómicas, a fim de garantir que as pessoas podem regressar às suas terras, que Cabo Delgado se pode desenvolver para que a atividade económica possa continuar", afirmou Louw-Vaudran.
Soluções duradouras para o terrorismo em Cabo Delgado
Para a investigadora, a comunicação com os grupos terroristas, para que se "rendam", pode ser um caminho a percorrer para travar o terrorismo.
Também Abudo Gafuro, presidente da Associação Kuendeleya, com base em Cabo Delgado, propõe a negociação com os responsáveis pelos ataques na província, e sugere a inserção social como uma medida para combater os conflitos.
"Sugestões sobre o processo de inserção social, a preparação daqueles que precisarem ou que estão aptos para poderem ser reinseridos dentro da sociedade, sendo desertores desses mesmos terroristas e oferecendo-lhes uma segunda oportunidade para poderem estar dentro da comunidade e serem acompanhados. Porque a maior parte dos jovens não tem sequer o décimo ano, ou mesmo estão com um baixo nível de escolaridade, e isto torna-os vulneráveis".
As "divisões profundas" entre as tropas estrangeiras que se encontram em Moçambique e a "pouca comunicação" entre a União Africana e a Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) são apontadas por Liesl Louw-Vaudran, num estudo divulgado pelo Instituto de Estudos de Segurança, como dois "grandes entraves" no combate ao terrorismo.
"Em março do ano passado, houve um grande ataque em Cabo Delgado, e depois houve uma mobilização da comunidade internacional. A Força de Reserva da União Africana, que é liderada pela SADC, a Comunidade de Desenvolvimento da África Austral, foi destacada em Cabo Delgado, mas o Ruanda e a sua força de defesa também foram destacados. O que digo no meu relatório é que existem duas intervenções militares numa província relativamente pequena de Moçambique e não vimos quaisquer discussões de alto nível entre o Presidente do Ruanda, Paul Kagame, e os líderes da SADC, como o Presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa".
A importância da segurança para o desenvolvimento da região
Para Abudo Gafuro, o principal desafio que o terrorismo acarreta é a manutenção da segurança. O presidente da Associação Kuendeleya defende que só é possível haver desenvolvimento em Cabo Delgado quando for garantida "a segurança da região e de toda a província da zona norte e centro, não só mantendo a segurança ou mantendo livre dos terroristas, Mocímboa da Praia e Palma".
"Isto é muito importante. A segurança é número um para o desenvolvimento de qualquer tipo socioeconómico ou cultural de um país, ou de uma nação, de uma província", ressaltou Gafuro.
No mês passado, o Banco Mundial anunciou que ia adicionar mais 100 milhões de dólares ao fundo que prometeu, no final de 2021, para apoiar o Governo moçambicano no plano de reconstrução de Cabo Delgado. A organização vai disponibilizar 200 milhões de dólares (172 milhões de euros) para o desenvolvimento da província.
De acordo com o estudo divulgado pelo Instituto de Estudos de Segurança, até à data, mais de 3.800 pessoas morreram e 800 mil foram expulsas das suas casas, em Cabo Delgado.