Brexit: Que saídas para esta confusão?
14 de março de 2019"Chega! Amigos britânicos, é hora de sair", comentou na quarta-feira uma internauta no Twitter, depois da primeira-ministra britânica Theresa May sofrer mais uma derrota no Parlamento.
A nova proposta de May para a saída do Reino Unido da União Europeia foi rejeitada pelos deputados britânicos na terça-feira (12.03), com 391 votos contra e 242 votos a favor - um resultado histórico. No entanto, o Parlamento insiste em sair da UE com um acordo: uma nova votação na quarta-feira confirmou essa intenção.
Por outras palavras, o Parlamento britânico continua, em princípio, a querer divorciar-se da União Europeia. Mas, assim que as coisas se tornam mais sérias e é preciso assinar os papéis, esquiva-se. Do outro lado, a UE mantém a compostura, embora, por dentro, comece a borbulhar de impaciência.
No bloco europeu, cresce um sentimento de cansaço após semanas, meses e anos de negociações, que não vão dar a lado nenhum. Isso nota-se nas conversas de café, nas ruas… Fala-se no "Brexit" e há quem deixe logo escapar um suspiro, de fadiga. "Que se decidam de uma vez por todas! Se ficam ou saem…"
Na capital da Europa, o clima não será muito diferente. As críticas são, muitas vezes, publicadas de forma anónima: "Do nosso lado, já não há muita paciência ou boa vontade", afirmou um oficial em Bruxelas, citado pela agência de notícias Reuters, sem divulgar o nome. Mais politicamente correto, o primeiro vice-presidente da Comissão Europeia, Frans Timmermans, disse esta semana que "a solução [para o 'Brexit'] tem de vir de Londres".
Que soluções?
A probabilidade de uma saída desordenada na data marcada para o "Brexit", 29 de março, aumentou com a segunda rejeição, na terça-feira, do acordo que a primeira-ministra britânica negociou com a UE (em janeiro, houve um primeiro chumbo pelo Parlamento britânico por uma margem ainda maior).
No Reino Unido e no resto do bloco teme-se o pior, caso haja um divórcio sem regras definidas: O que fazer com os produtos nas fronteiras? Como será o comércio? Ou o que fazer aos turistas, que já marcaram férias? Precisarão de um visto?
Um diplomata europeu, que pediu para ficar no anonimato, disse esta semana que "só há duas formas de sair da UE: com ou sem acordo. E a UE está preparada para ambos os cenários". Mas o processo pode ser mais complicado. Estes são alguns cenários possíveis:
1. Saída sem acordo: com o 29 de março a aproximar-se, aumenta também a probabilidade de uma saída do Reino Unido da União Europeia sem acordo. Pela legislação britânica atualmente em vigor, o país vai sair nessa data - com ou sem a aprovação de um acordo pelo Parlamento em Londres. Mas o tempo urge e Theresa May sugere agora pedir a Bruxelas uma "prorrogação técnica curta e limitada", até 30 de junho.
As consequências económicas de uma saída sem acordo seriam graves. Temem-se insolvências de muitas empresas pequenas e médias que dependem do mercado europeu para as suas exportações, poderá haver escassez de medicamentos que atualmente são importados da UE. E voltaria a haver, de um dia para outro, controlos na fronteira entre as duas Irlandas: República da Irlanda (que continua na União) e Irlanda do Norte (que sairia, por ser parte do Reino Unido), o que poderia colocar em risco a paz na ilha entre católicos republicanos e evangélicos unionistas.
2. Adiamento: Segundo May, o adiamento "técnico" permitiria implementar um acordo com a UE, que poderia ser aprovado pelo Parlamento britânico (numa terceira tentativa) até à próxima quarta-feira, 20 de março, um dia antes dos líderes europeus se reunirem em Bruxelas. Mas, até agora, não há maioria à vista no Parlamento, a favor do acordo de Theresa May.
Mas fala-se também num adiamento maior do que o sugerido por May. Esta quinta-feira (14.03), o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, disse no Twitter que vai solicitar aos 27 países da União Europeia para estarem abertos a "um longo adiamento" do "Brexit", caso o Reino Unido o deseje. Não é certo que os países aprovem o pedido. O voto tem de ser unânime.
Os líderes europeus reúnem-se em Bruxelas de 21 a 22 de março, e o "Brexit" será um dos tópicos principais na agenda. Mas a questão que se coloca agora é: se o "Brexit" for adiado por muito tempo, será que os britânicos vão votar nas eleições europeias de maio? Se saíssem a tempo, já não participariam.
3. Referendo ou novas eleições gerais: Para ultrapassar o impasse no Reino Unido, têm sido aventadas outras sugestões: realizar um novo referendo sobre o "Brexit", novas eleições (embora May não se tenha mostrado disposta a renunciar) ou mudar de estratégia.
No entanto, reina a incerteza: "Continuamos sem saber se haverá votos suficientes no Parlamento para um novo referendo" ou para rever o "Brexit", comentou o professor universitário Steve Peers em entrevista à agência de notícias AFP. "Por enquanto, não parece que haja".
4. Nova estratégia: A possibilidade de se enveredar por um "soft Brexit" parece ganhar alguma força. "Aqueles que estão abertos a um compromisso de um 'soft Brexit' são os que mais deverão beneficiar", diz Steve Peers sobre o impasse atual.
Se os deputados britânicos optassem por um "soft Brexit", o Reino Unido sairia da União Europeia, embora continuasse no mercado único e na união aduaneira. Mas, por enquanto, no Parlamento, ainda não há uma maioria para avançar por esta via.
Enquanto a base do maior partido da oposição, Labour (partido trabalhista) e a maioria dos outros partidos de oposição apoiam a realização de um segundo referendo, a liderança do Labour está a favor de uma saída ao estilo "soft Brexit". O líder do partido, Jeremy Corbin, já iniciou conversas com deputados conservadores para sondar as possibilidades.
5. Cancelamento do "Brexit": Outra hipótese é o Reino Unido desistir do divórcio e revogar unilateralmente a ativação do artigo 50 do Tratado de Lisboa, que permite a um membro sair da UE.
Ao contrário do adiamento, para o qual o Reino Unido precisa da aprovação de todos os 27 Estados-membros da União, a revogação definitiva do processo de saída pode ser feita de forma unilateral.
Para já, isso parece pouco provável. O Parlamento britânico pode ainda não saber em concreto o que quer, como afirmou a primeira-ministra Theresa May na quarta-feira, mas sabe há muito tempo o que não quer: ficar na União.