Brexit: Como fica a relação entre Reino Unido e África?
31 de janeiro de 2020O Reino Unido abandona a União Europeia oficialmente às 23 horas desta sexta-feira. Os britânicos procuram estabelecer uma nova posição fora do bloco e as dinâmicas de poder em Bruxelas estão a mudar.
Poderão os governos africanos tirar vantagens destas mudanças?
Certo é que Londres já começou a preparar o futuro, em busca de novas parcerias em África. Recentemente, o primeiro-ministro britânico Boris Johnson faltou ao Fórum Económico Mundial em Davos para se concentrar no Brexit.
Há alguns dias, Johnson recebeu mais de uma dezena de chefes de Estado africanos na cimeira Reino Unido-África, em Londres. Foram anunciados acordos de mais de 7 mil milhões de euros. A mensagem foi clara: o Reino Unido está pronto para fazer negócios com África.
Busca por parceiros
Mark-Anthony Johnson, diretor-executivo da empresa de investimentos JIC Holdings, participou na organização da cimeira e prevê uma relação comercial mais intensa entre Reino Unido e África.
"O Reino Unido tem de encontrar novos parceiros com quem possa trabalhar a longo prazo para construir a sua economia. Claro que África, com o seu enorme potencial, é o parceiro ideal", afirma o diretor.
Há 112 empresas africanas cotadas na Bolsa de Londres, com uma capitalização superior a 200 mil milhões de euros. A capital britânica é o mais importante centro de negócios de África fora do continente, e Londres quer intensificar os laços com as bolsas africanas.
O Reino Unido é uma das maiores economias do mundo e a segunda maior da União Europeia, a seguir à Alemanha. O Brexit pode significar um novo parceiro para África. No entanto - como os principais beneficiários da ajuda ao desenvolvimento da União Europeia - os países africanos poderão também sentir o impacto da saída do Reino Unido no orçamento do bloco. Por outro lado, o Brexit deixará mais espaço de manobra a Paris e a Berlim no que diz respeito ao continente africano, considera Uzoamaka Madu, consultora especializada nas relações entre a União Europeia e África.
“Os outros actores importantes, Alemanha e França, vão apostar – e já estão a apostar – em fazer-se ouvir mais na União Europeia nas questões africanas”, afirma Uzoamaka Madu.
Movimentos da UE
A consultora aponta o Presidente francês como exemplo. Emmanuel Macron parece estar a adotar uma nova postura nas relações com África. Em dezembro, anunciou com oito países africanos o fim do franco CFA, contestado como um símbolo da presença colonial francesa. E reconheceu o colonialismo como “um erro profundo”, comenta Madu.
A Alemanha também parece querer preencher o vazio deixado pelo Reino Unido nas políticas comuns, sejam elas comerciais ou diplomáticas. Em Davos, a chanceler Angela Merkel apelou a uma cimeira com países africanos. E no início do mês, o ministro alemão do desenvolvimento, Gerd Müller, tinha já afirmado que Berlim quer trabalhar num novo pacto europeu com África quando a Alemanha assumir a presidência do Conselho da União Europeia, na segunda metade de 2020.
A União Europeia e o Grupo de Estados de África, Caraíbas e Pacífico (ACP) já estão a negociar um novo acordo de parceria. Mas a questão é se os países africanos vão negociar através da ACP ou da União Africana, diz Annie Mutamba, especialista em relações União Europeia-África, em Bruxelas. A União Europeia está a tornar-se cada vez mais um importante actor global, especialmente com a criação Zona de Livre-Comércio Continental Africana – uma iniciativa apoiada por Bruxelas.
“A União Europeia está claramente a financiar atividades para promover a integração continental, porque o que o bloco quer é uma parceira em nível de continentes", aponta Annie Mutamba.Uzoamaka Madu acretia que a zona de livre-comércio vai ajudar.
“Juntarem-se na Área de Comércio Livre Continental Africana vai levar os líderes africanos a chegar a uma posição comum numa série de questões económicas muito importantes”, afirma a consultora.
Para já, os acordos continuam a ser sobretudo bilaterais, em particular nas questões do comércio e desenvolvimento.
Uma abordagem dividida que fragiliza os países africanos, impedindo-os de terem uma maior influência na estratégia da União Europeia para África.